Estiagem já resulta em aumento dos preços de arroz, feijão e carne em MS
Dados do Dieese apontam alta de até 21% para os itens no intervalo de 12 meses; a cesta básica é cotada a R$ 714,63 na Capital
| CORREIO DO ESTADO / EVELYN THAMARIS
Com impacto direto no bolso do consumidor, a falta de chuvas já afeta os preços de alimentos essenciais na mesa dos brasileiros. Em Mato Grosso do Sul, dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revelam uma alta de 21,85% no preço do pacote de arroz com 5 quilos no acumulado dos últimos 12 meses, por exemplo. Outros produtos que também tiveram majoração nos preços foram o feijão e a carne bovina.
Conforme os preços monitorados pelo Dieese, o pacote com 5 kg de arroz branco, o principal componente da alimentação básica do brasileiro, custava R$ 25,90 em setembro do ano passado, enquanto neste ano passou para R$ 31,55 (21,85%), acréscimo de R$ 5,65 em um ano. Considerando apenas o intervalo entre dezembro de 2023 e setembro deste ano, a alta foi de 9,5%.
O feijão também teve aumento de preços ao longo de 12 meses, passando de R$ 6,91 por quilo para uma média de R$ 7,43 por quilo no mês passado – alta de 7,68%.
Segundo dados do Dieese, em Mato Grosso do Sul, a carne bovina segue tendência de alta, registrando elevação porcentual de 4,20% em um ano. O quilo da carne vermelha, que custava R$ 34,28 em setembro do ano passado, chegou a R$ 35,72 em setembro deste ano.
O economista do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo, ressalta que os últimos anos têm sido muito ruins para a produtividade de grãos no Brasil.
“De 2023 para cá, a produção das lavouras sofreu com intempéries climáticas. Muitos se lembram dos problemas que tivemos no Rio Grande do Sul, inundou praticamente todo o estado, assim como a forte onda de calor que afetou o Centro-Oeste do País, em especial Mato Grosso do Sul”.
Melo comenta que a situação interfere no processo inflacionário de forma significativa, principalmente em produtos essenciais da cesta básica, como o arroz. “Isso porque nos mercados agrícolas imperam as leis de mercado, o equilíbrio entre oferta e demanda”, explica.
O economista Eduardo Matos pontua que nesses momentos de crise climática fica mais evidente a relação entre a produção, a economia, o meio ambiente e os recursos naturais de um modo geral.
“A produção agrícola cai por falta de chuva, então, nesses itens, em razão de uma produção menor e da demanda estável, o aumento ocorre no processo”.
Melo detalha que quando a demanda de um produto é maior do que a oferta, naturalmente, os preços sobem. “Esse desequilíbrio ocorre pela conjunção de fatores como a melhora do poder de compra do brasileiro, a falta de oferta de alimentos e, claro, as questões climáticas”.
Ele ainda complementa explicando que, quando o clima colabora, a produção de alimentos tem um salto de produtividade que reduz, em termos relativos, os custos de produção, fazendo com que o produtor consiga levar o produto mais barato ao mercado e não precise repassar os seus custos.
“No caso da carne bovina, por se tratar de uma produção de ciclo alongado, os estoques de animais oriundos da retenção de fêmeas entre os anos de 2020 e 2022 foram suficientes para impedir uma elevação agressiva nos preços da carne bovina em 2023 e 2024. Ainda que os problemas de clima tenham também afetado o elo pecuário, o impacto ainda é razoável, como pode ser observado ao longo dos 12 meses considerados”, ressalta o economista do SRCG.
Matos comenta que a disponibilidade de alimentos para os animais diminui e os produtores acabam tendo de investir mais em suplementação e em ração, fazendo com que o custo para a produção de carne fique mais elevado. Além disso, há o fato de que a maior parte das rações é composta por milho e soja, itens que também são prejudicados pela falta de chuvas.
Outra consequência da estiagem que também afeta preços de produtos é produção de energia, tendo em vista que a maior parte da energia gerada no Brasil provém de hidrelétricas. A partir do momento que há uma estiagem, os reservatórios ficam mais baixos e é necessário ativar outras fontes de geração.
“A primeira que é ativada é a das termelétricas, que é fácil de ser ativada e desativada e, por isso, acaba sendo a primeira opção. E dentro desse hall de termelétricas existem aquelas a biomassa, a carvão, a diesel, que são combustíveis que não são tão baratos, com exceção da biomassa. O diesel e o carvão são combustíveis custosos”, destaca Matos.
Em Campo Grande, conforme levantamento do Dieese, o aumento no custo da cesta básica é reflexo de uma tendência de alta nos preços de outros alimentos. Ao comparar os valores de setembro de 2023 e setembro deste ano, a capital sul-mato-grossense registrou um incremento de 5,76% na cesta, destacando-se entre as cidades que mais sofreram elevações nos preços. O preço da cesta básica registrado em setembro foi de R$ 714,63.
Além disso, nos primeiros nove meses deste ano, Campo Grande apresentou uma alta de 2,43% nos preços médios, posicionando-se entre as capitais que enfrentaram as maiores variações, ao lado de São Paulo (4,13%) e Rio de Janeiro (2,53%). Essa situação reforça a preocupação com o impacto da inflação no cotidiano dos cidadãos, evidenciando a necessidade de estratégias que mitiguem os efeitos desse aumento no bolso da população.
A seca se tornou um desafio crescente para a agropecuária em Mato Grosso do Sul, impactando diretamente o custo da produção e, por consequência, a ponta da cadeia produtiva. O agrometeorologista Danilton Flumignan, da Embrapa Agropecuária Oeste, ressalta que a imprevisibilidade climática tem afetado de forma significativa as atividades agrícolas, além de dificultar a manutenção das pastagens na região. “Isso resulta em um aumento dos custos de produção, afetando, por consequência, os preços de comercialização”, frisa.
Após a incidência de um El Niño considerado forte sobre a Região Centro-Oeste, responsável pelo ciclo climático adverso, especialistas apontam ainda os efeitos do fenômeno La Niña. “O fenômeno pode impactar a produção agrícola da segunda metade do ano em função das condições climáticas desfavoráveis”, afirma Flumignan.
O agrometeorologista da Embrapa Agropecuária Oeste Éder Comunello ressalta que a confirmação de um cenário de La Niña a partir do fim do mês passado poderá afetar diretamente a próxima safra de verão. “Em MS, o La Niña está associada a chuvas menos frequentes e inferiores à média, o que é particularmente preocupante, dado que, nos últimos anos, temos observado uma redução na disponibilidade hídrica e temperaturas mais altas”.
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