Seca provoca queda na arrecadação de impostos e afeta o consumo local

O mestre em Economia explica ainda que a situação pode exacerbar as desigualdades regionais, já que as comunidades mais dependentes da agricultura são as mais afetadas

| CORREIO DO ESTADO /EVELYN THAMARIS


Safras de soja e milho amargaram perdas em decorrência do clima - Paulo Ribas

A estiagem prolongada tem gerado um efeito em cadeia que impacta diretamente a economia local, resultando em uma desaceleração não só na arrecadação tributária, mas também no consumo. Conforme dados do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) teve alta de apenas 3,59% nos oito primeiros meses do ano, passando de R$ 10,66 bilhões em 2023 para R$ 11,04 bilhões no mesmo período deste ano.

A diminuição na produção agrícola, impulsionada pela falta de chuvas, compromete a receita do ICMS, mas também afeta a renda dos produtores, gerando uma diminuição na demanda por bens e serviços. 

No acumulado de janeiro a agosto, o ICMS foi o responsável por 88,69% dos tributos recolhidos em Mato Grosso do Sul. No recorte por setor econômico, a agropecuária (setor primário) registra queda de 17,10% no recolhimento de ICMS. De janeiro a agosto do ano passado, foi angariado R$ 1,094 bilhão, enquanto no mesmo período deste ano foram R$ 907 milhões. 

O mestre em Economia Lucas Mikael reitera que, ao afetar a produção agrícola, a seca contribui para a diminuição da receita tributária, especialmente no que diz respeito ao ICMS, que é fortemente dependente do desempenho do setor agropecuário.

“Esse cenário impacta não só a arrecadação, mas também a dinâmica econômica do Estado. A diminuição na produção agrícola resulta em menor renda para os produtores, afetando o consumo local e reduzindo a demanda por bens e serviços”, explica.

Sendo assim, Mikael detalha que ocorre um efeito em cadeia, em que a queda na atividade econômica gera uma pressão adicional sobre a arrecadação, dificultando investimentos em infraestrutura e serviços essenciais.

O mestre em Economia explica ainda que a situação pode exacerbar as desigualdades regionais, já que as comunidades mais dependentes da agricultura são as mais afetadas.

“A falta de políticas adequadas para mitigar os efeitos da estiagem pode agravar a vulnerabilidade econômica dessas áreas, dificultando a recuperação e a diversificação econômica, que são tão necessárias para um desenvolvimento sustentável”, analisa.

O economista Eduardo Matos corrobora pontuando que queda a nível real da arrecadação tem muita influência da estiagem, visto que a base agropecuária do Estado influencia na economia estadual. 

“Como já dito, não provoca só uma queda no rendimento da agropecuária, mas como a agropecuária tem uma forte influência em outros segmentos da economia, esses outros segmentos também são prejudicados, resultando um efeito dominó, em que um setor acaba prejudicando o outro, de maneira direta ou indireta”, analisa.

Entretanto, para Matos, apesar de haver a existência do problema, não é algo preocupante, pelo menos não no curto e no médio prazo. “É claro que, se esse quadro se perdure, aí há um comprometimento nos investimentos públicos”, afirma.

O crescimento em relação a agosto de 2023 foi de 1,95%, o que representa menos da metade da taxa de inflação oficial dos últimos 12 meses, que, no fim de agosto, era de 4,24%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em termos reais, ajustando pela inflação, a arrecadação de impostos foi inferior à do mesmo mês do ano passado.

Este é o sexto mês consecutivo em que a arrecadação estadual cresce abaixo da inflação, e esse padrão se repete ao longo do ano. Segundo o Confaz, o aumento nos primeiros oito meses foi de 3,21%, subindo de R$ 12,848 bilhões em 2023 para R$ 13,260 bilhões neste ano.

O ICMS, principal fonte de arrecadação, é uma das que estão apresentando crescimento abaixo da inflação, com uma alta de 3,59% nos primeiros oito meses do ano, passando de R$ 10,66 bilhões para R$ 11,04 bilhões.

No item outros impostos, a situação é mais crítica, com um faturamento que caiu 3,66%, passando de R$ 946 milhões para R$ 911 milhões. Em relação ao Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), que representa 7,5% do faturamento estadual, a situação é um pouco melhor, com uma alta de 5,5%, saltando de R$ 941 milhões para R$ 993 milhões.

Por último, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD ou ITCMD), apresentou uma arrecadação de R$ 241,394 milhões, com uma alta de 8,11% em comparação aos R$ 223,284 milhões registrados no ano passado.

Conforme já noticiado pelo Correio do Estado, a estiagem e a irregularidade de chuvas impactou fortemente a agricultura de Mato Grosso do Sul. Projeção realizada pela reportagem, com base nos dados disponibilizados pelo relatório do Sistema de Informação Geográfica do Agronegócio (Siga-MS) e por meio de consultoria técnica de agentes do setor, aponta para prejuízos de mais de R$ 10,3 bilhões na safra 2023/2024.

Dados da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul (Aprosoja-MS) mostram que somente a segunda safra de milho amargou redução de 40,52% em relação ao ano anterior.

No ciclo 2022/2023, a produção do milho foi de 14,220 milhões de toneladas em MS. Já na safra 2023/2024, a produção foi de 8,457 milhões de toneladas, redução de 5,763 milhões de toneladas.

A saca de milho era comercializada pelo preço médio de R$ 51,19 no fechamento da safra em MS. Considerando que 5,763 milhões de toneladas são 96,050 milhões de sacas, o prejuízo estimado é de R$ 4,9 bilhões.

A área produzida de milho na segunda safra atingiu 2,102 milhões de hectares, queda de 10,7% em relação aos 2,355 milhões de hectares colhidos no ciclo anterior. A produtividade média ponderada no ciclo atual foi de 67,05 sacas por hectare, redução de 33,37% (33,59 sacas a menos) em comparação ao ano anterior, quando foram colhidas 100,64 sacas por hectare.

Na safra de soja não foi diferente. O Estado saiu de uma produção recorde de 15,007 milhões de toneladas na safra 2022/2023 para 12,347 milhões de toneladas de grãos no ciclo 2023/2024, redução de 2,660 milhões de toneladas. 

O preço médio da saca de soja era de R$ 123,75 no período de fechamento da colheita, considerando que 2,660 milhões de toneladas são 44,333 milhões de sacas de soja. Levando em consideração o preço médio da saca, os produtores de Mato Grosso do Sul deixam de faturar em torno de R$ 5,4 bilhões. 

Somando-se a primeira e a segunda safra 2023/2024, é possível afirmar que o produtor rural sul-mato-grossense deixa de ganhar R$ 10,3 bilhões com a agricultura no ciclo. (Colaborou Súzan Benites) Assine o Correio do Estado

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